Questão protocolar, coisas da política luso-brasileira 200 anos atrás. O jovem D. Pedro I responde à corte portuguesa que ficaria em terras brasilis, nada de pegar o primeiro voo. Vídeoconferência encerrada, o regente deixa o celular de lado e vai cuidar da agenda da nova colônia.
E que frase é postada nas redes sociais: “Se é para o bem de todos e felicidade geral da nação…”. Seria mais que ótimo se a política de hoje sustentasse isso. Opa, mas é preciso dizer que essa frase no perfil do regente não é original do portuga ilustre, coisa de marqueteiros bem pagos que cuidaram de cravar o Dia do Fico como rebelião.
O que há de verdade nessa história é que em 9 de janeiro de 1822, rolou esse trâmite na Câmara do Rio com D. Pedro não seguindo o rito de Lisboa onde os criquis do império entortaram o nariz; mas a família real não entendeu assim e recebeu muito de boa o não do jovem Pedro. No mais, a presença dele no Brasil reforçava a marca lusitana na política. Lembrando, esse cenário não tem nada a ver com ideias de independência – nada disso rolava ainda. Por fim, o Dia do Fico não tem nada de heroico.
Posteriormente, os marqueteiros de campanha bolaram a frase no perfil do regente, um fake news da hora para satisfazer investidores políticos locais. Se D. Pedro não assina a frase do perfil, o que há de fato na história do Fico? Nos autos da Câmara do Rio está registrado: ” Convencido de que a presença de minha pessoa no Brasil interessa ao bem de toda a nação portuguesa, e conhecido de que a vontade de algumas províncias assim o requer, demorarei a minha saída até que as Cortes e meu Augusto Pai e Senhor deliberem a este respeito, com perfeito conhecimento das circunstâncias.”
Veja só, desse Fico absolutamente manso e suave os marqueteiros bolaram uma frase de efeito espetacular. E o que fica desse Fico é que D. Pedro permanece no Brasil por interesse do bem de toda nação portuguesa. Ele falava em nome do império, nada a ver com levante de independência.
VAMOS DE SAMBA
Carnaval do Rio em 1962 com a Beija-Flor falando dessa história conforme o perfil postado pelos marqueteiros de D. Pedro. A letra é do compositor Cabana, nome que marca o samba-enredo, um dos maiores talentos carnavalescos. Nesse ano, a Beija ainda está longe de ser a escola de hoje – somente em 1973 entraria na elite e para se tornar gigante. O samba de Cabana é rapidinho, um resumo do Fico marcado num compasso alegre e simples.
Décadas depois, ganhou voz em Martinho da Vila, gravação de 1980 e que ouvimos aqui. E sobre o carnaval de 1962, a Beija-Flor foi vice-campeã do Grupo 2 que teve a Unidos do Bangu em primeiro. E sobre o compositor, Anísio Cabana é autor de Ilú Ayê, dado como clássico dos clássicos do samba-enredo.