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21 de novembro de 2024
QG Notícias

LAMARCA: em Osasco contra a ditadura, até execução há 52 anos

Como é dito hoje, sextou para o guerrilheiro Carlos Lamarca. Estamos em 17 de setembro de 1971, ele com 33 anos e sendo caçado pela ditadura militar. Sexta-feira com o Doi-Codi na pressão em Salvador, sob comando do major Nilton de Albuquerque Cerqueira com a Operação Pajussara.

Sim, o capitão Lamarca era perseguido como desertor do Exército e revolucionário comunista, vilão da vez a ser abatido em nome do verde e amarelo do Brasil. O major do Doi-Codi era também comandante da 2ª Seção do Estado-Maior da 6ª Região Militar e contava mais de 200 homens na operação – policial local, Doi-Codi São Paulo, Aeronáutica, Exército, Marinha e Polícia Federal da Bahia.

O cerco foi montado em Buriti Cristalino, sertão baiano em 28 de agosto, culminando nesse 17 de setembro de 1971, uma sexta-feira em Ipupiara, região de Brotas de Macaúbas. A notícia da morte do subversivo seria festejada em manchetes da grande mídia. Lembrando, a ditadura controlava e alimentava os jornais.

Hoje não é mais segredo militar: para chegar ao comunista a ação cumpriu prisões e torturas aleatórias, além de execuções ao estilo nazista: Iara Iavelbegt, José Campos Barreto, Luiz Antônio Santa Bárbara, Otoniel Campos Barreto, Nilda Carvalho Cunha e Esmeraldina Carvalho Cunha entre os assassinados – José Campos Barreto era o Zequinha, um dos líderes do movimento sindical em Osasco.

Iavelberg era namorada do capitão e teve o apartamento invadido em agosto – morta sumariamente e os demais foram presos; a partir daí o Doi-Codi fez os procedimentos para arrancar a localização de Lamarca e conseguiu – Zequinha Barreto o havia levado para Buriti Cristalina, terra natal do sindicalista de Osasco.

A ditadura localizou o reduto dos fugitivos, rompeu fogo que feriu Oderico Barreto, irmão de Zequinha; outro irmão dele, Otoniel de apenas 20 anos, abatido com vários tiros. Os agentes do governo barbarizaram toda região na caçada, furiosos porque Lamarca e Zequinha havia escapado.

Os vinte dias seguintes foram terríveis para os dois, embrenhados no sertão baiano. Já exaustos, chegaram ao ponto final, povoado de Pintada em Ipupiara. O Exército anunciava prêmio em dinheiro por informações e alguém que vira os comunistas passando por Três Reses bateu continência, logo a 6ª Região do Exército faria o cerco.

Tarde de sexta-feira, 17 de setembro de 1971. Os terroristas estavam à sombra de uma baraúna, árvore típica dali, quando foram surpreendidos – tentando a fuga, Lamarca foi abatido no ato, Zequinha tombaria poucos metros à frente. Ambos estavam bem fragilizados fisicamente e sem forças para qualquer reação.

O capitão levou sete tiros e o corpo ficou em exposição na praça de Brotas de Macaúbas, ao lado do companheiro Zequinha – troféus da vitória do Brasil; posteriormente, um helicóptero levaria os terroristas para a capital Salvador onde foram sepultados no Cemitério do Campo Santo.

Os túmulos ficaram sob vigilância até 1973 quando foram transladados para o Rio de Janeiro após exumação. Já em 1996 e após segunda exumação, o perito Celso Nenevê e o legista Nelson Massini redefiniram a cena do crime em processo deferido em setembro de 1996 – alegação que os foragidos foram sumariamente executados quando deveriam ter sido detidos.

EM OSASCO

Capitão do Exército no quartel de Quitaúna em 1964, Lamarca é acusado como traidor, desertor, guerrilheiro, assaltante de bancos, sequestrador, comunista e subversivo. Carioca nascido em outubro de 1937, estava com 33 anos quando levou os sete tiros. Ainda adolescente, ele já se envolvia em movimentos estudantis e lia Tolstoi. Entrou na Escola Preparatória de Cadetes em Porto Alegre, depois faria a histórica Academia Militar das Agulhas Negras em Resende; como aspirante a oficial em 1960, teve batismo de comando no 4º Regimento de Infantaria em Osasco, quartel de Quitaúna.

Em 1962, o jovem oficial formou a Força de Paz das Nações Unidas na Faixa de Gaza. Os dezoito meses que passou nessa missão seriam decisivos para colocá-lo contra a ditadura. De volta ao Brasil, montou posto na Polícia do Exército em Porto Alegre, foco do golpe militar um ano após; em 1965 ele estaria novamente no quartel em Osasco, dois anos depois seria promovido a capitão.

E foi nessa patente que ele começaria a planejar campanhas reais contra a ditadura, dentro do próprio quartel. Assim que o governo militar assina o letal AI-5, Lamarca tem tudo bem planejado para atacar o Palácio dos Bandeirantes, a Academia de Polícia e o QG do II Exército.

Nada deu certo por conta de um lance de sorte da polícia em Itapecerica da Serra, ação que inesperadamente chegaria a três revolucionários e que faria Lamarca abortar os ataques levante. Com a ação desbaratada, o capitão e companheiros de farda deixam o quartel levando fuzis, metralhadoras e munições e dão início à luta contra a ditadura.

Talvez um dia essa história volte ser contada sob outro olhar, falando de um brasileiro valente enfrentando uma máquina mortal que pisaria o país por duas décadas; talvez um dia, o capitão Lamarca tenha a vida resgatada pela história do Brasil.

“Por determinação do presidente da República, qualquer publicação sobre Carlos Lamarca fica encerrada a partir da presente data em todo país. Esclareço que qualquer referência favorecerá a criação do mito ou deturpação, propiciando imagem de mártir que prejudicará interesses da segurança nacional” – advertência publicada pela Censura Federal nos jornais em 22 de setembro de 1971.

Neste 17 de setembro é feriado municipal em Ipupiara onde o capitão tem estátua e praça como homenagens – inaugurados em janeiro de 2007; em São Bernardo do Campo há uma rua com o nome do guerrilheiro do Brasil.

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