Em fevereiro de 2022, poucos dias antes da invasão da Ucrânia pela Rússia, o presidente Jair Bolsonaro desembarcava em Moscou, desafiando a pressão internacional e recebendo críticas do Departamento de Estado dos EUA, que consideraram a visita inoportuna
Bolsonaro era exaltado pela militância, tratado como mito e com imagem próxima ao culto à personalidade. Por ter Messias no nome, chegava mesmo a ser reverenciado como missionário dos céus.
A visita de Bolsonaro tinha, sim, propósito pessoal de reforçar esse ideal de herói destemido mas, também, levava protocolo de intenções para o agronegócio – motor de arranque eleitoral.
Três anos depois, o Brasil está novamente na Rússia, agora com o presidente Lula. Se em 2022 a direita ostentava o bolsonarismo ao lado de Putin, hoje dispara duras críticas ao governo da esquerda.
Embora a Rússia, Putin e o protocolo diplomático permaneçam os mesmos, a intenção por trás das visitas de Bolsonaro e Lula difere significativamente. Bolsonaro esteve lá pela base do agro, Lula está pelo multilateralismo e cooperação internacional para tecnologia, fertilizantes e energia – em 2023 as exportações de carne bovina e de aves para a Rússia bateram US$306 milhões.
Putin renovou quotas e reduziu tarifas, programa que deve ser reforçado agora com Lula. Desde a 16ª Cúpula do BRICS em Kazan, em 2024, Brasil e Rússia vêm discutindo a implementação da certificação eletrônica para produtos de origem animal, visando desburocratizar e agilizar as exportações brasileiras para o mercado russo
Nessa visita do governo brasileiro à Rússia, também está o planejamento de ampliar comercio e parcerias no mercado euroasiático.
De volta a Bolsonaro em 2022, vale lembrar que ele era o mítico que posava para fotos com gestos simbolizando dedo no gatilho – era o defensor do direito ao armamento civil. Quando esteve na Rússia com Putin, reforçava essa figura heroica ao somar com um regime de alto poder ultraconservador, tradicional, iliberal.
Com Lula agora, não há nenhum vestígio ideológico nas fotos com Putin; a visita é protocolarmente diplomática. Sim, o presidente do Brasil aproveita essa vitrine para criticar os tarifaços dos Estados Unidos.